Em seus cerca de 220 sermões (são peças oratória de cerca de 50 páginas, em média), Vieira abordou temas sacros e profanos, sempre com paixão e eloquência, com objetividade e sapiência, com amor e inteligência, com oportunidade e consciência; e, entre os nove sermões designados de Santo Antônio (de Lisboa, dito de Pádua), o que hoje abordamos é o dos peixes, decerto o mais conhecido, e, indiscutivelmente, entre todos o mais brilhante, até porque inspirado no famosíssimo e homónimo sermão do Santo, também ele brilhantíssimo orador sacro, se bem que, ambos, profundos psicólogos, sensíveis sociólogos, sapientíssimos filósofos, brilhantes estilistas, atributos diuturnamente comprovados, pelo que muitos e profundos ensinamentos transmitem aos leitores. Neste sermão, começa Vieira por declarar: "Nas festas dos santos, é melhor pregar como eles, que pregar deles". Foi pregado a 13 de junho de 1654 em São Luís do Maranhão, e é como que uma continuação do Sermão das Tentações, também pregado perante os colonos, em defesa da libertação do índios escravos, quando Vieira lhes atirou: Que vós, que vossas mulheres, que vossos filhos e que todos nós nos sustentássemos DOS NOSSOS BRAÇOS; porque melhor é SUSTENTAR do SUOR PRÓPRIO, QUE DO SANGUE ALHEIO"!.
O "Sermão das Tentações" teve certo impacto entre os colonos esclavagistas, mas, com o tempo, tudo foi regressando ao estado anterior, pelo que o nosso EVANGELIZADOR, no ano seguinte, achou por bem voltar à carga, e fê-lo magistralmente com o "Sermão de Santo Antônio", ou dos Peixes, onde usou abundantemente de metáforas e alegorias, no sentido de impressionar e influenciar as "almas" de seus ouvintes, deles conseguindo, assim, algumas regalias para os pobres índios seus protegidos, objecto, meta e razão de ser de seu apostolado. Neste sermão, Antônio Vieira começou por dissertar sobre o tema "
Vós sois o sal da Terra", enquanto elemento inibidor da CORRUPÇÂO - das almas, que também dos corpos - após o que passou ao tema principal (os homens peixes), para, logo depois, apontar a sua bateria de argumentos, exemplos e questionamentos contra as injustiças e violencias dos "grandes" contra os "pequenos", dos poderosos contra os indefesos, dos parasitas contra os que trabalham. Foi então que desferiu esta certeira acertiva:
"A primeira coisa que me desedifica de vós - peixes - É QUE VÓS VOS COMEIS UNS AOS OUTROS. Não só vos comeis uns aos outros, SENÃO QUE OS GRANDES COMEM OS PEQUENOS. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comessem os grandes, bastaria um grande para muitos pequenos; mas, como os grandes comem os pequenos, NÃO BASTAM 100 PEQUENOS, nem 1.000, PARA UM SÓ GRANDE, e, para que vejais que estes comidos na terra são os pequenos, e pelos modos que vós vos comeis no mar...OS HOMENS, COM SUAS MÁS E PERVERSAS COBIÇAS, vêm a ser como os peixes, que se comem uns aos outros...Santo Agostinho, que pregava aos homens, para encarecer a fealdade deste escândalo, mostrou-lho nos peixes; e eu, que prego aos peixes, para que vejais quão feio e abominável é,QUERO QUE O VEJAIS NOS HOMENS. Olhai, peixes, lá do mar para a terra...cuidais que só os tapuias (índios) se comem uns aos outros?. Muito maior açougue é o de cá, MUITO MAIS SE COMEM OS BRANCOS".
Desde então - como agora e sempre, por todos os séculos - vêm os homens de bem (recordemos os Homens Bons, como eram chamados os venerandos vereadores dos municípios de antanho, que nada ganhavam para - com competência e honradez - governar os seus munícipes, e cotejêmo-los com a caterva de hoje) pregando mais para os peixes que para os governantes e poderosos, uns e outros, na maioria dos casos, comendo por si e por muitos, "quando um só dos GRANDES daria para sustentar 100 ou 1.000 dos pequenos"!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!. Como dizia Camões - mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, muda-se o prazer e a confiança - tudo é feito de mudança...- só neste caso continua a mesma dança!!!, diríamos nós, olhando as misérias deste mundo, face a tanto desperdício, a violência, que atinge principalmente os pacíficos, a maldade, que ataca especialmente os bons, a indignidade, de que são vítimas normalmente os dignos, a miséria em que se encontram os que mais arduamente trabalham e produzem. PENSEM EM TUDO ISTO!!!
(José Verdasca, escritor português)
quinta-feira, 13 de março de 2008
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1 comentário:
Olha parabéns o texto ficou muito bom.
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