domingo, 28 de setembro de 2008

“Os Açores na rota do Padre António Vieira” na Universidade

DE DIÁRIO DOS AÇORES, 28.9.08

O IV centenário do nascimento do Padre António Vieira, figura ímpar da cultura portuguesa e brasileira, assinala-se este ano em todo o país, no Brasil e em Itália.

Trazido pelo acaso ou pela mão da Providência, o Padre António Vieira esteve nos Açores alguns meses em 1654, na sequência de uma viagem atribulada que o trazia do Brasil em direcção ao reino. O navio naufragou perto do Corvo, acabando os náufragos por serem salvos por corsários holandeses que, depois da pilhagem, os deixaram na Graciosa. Daí o jesuíta passou com os seus companheiros de infortúnio à Terceira, e depois a S. Miguel.

Com o colóquio Os Açores na Rota do Padre António Vieira, a Universidade dos Açores nos dias 15, 16 e 17 de Outubro associa­-se às comemorações do Ano Vieirino 2008, promovendo o estudo pluridisciplinar de várias dimensões da obra de uma personalidade fundamental da nossa cultura seiscentista.

No dia 15, às 21h00, a sessão de abertura tem lugar num local que se reveste de um intenso significado simbólico: a Igreja do Colégio, onde o Jesuíta subiu ao púlpito e pregou em 1654. Aí, Aníbal Pinto de Castro, Professor catedrático da Universidade de Coimbra, pessoa bem conhecida no nosso meio cultural e autor de estudos fundamentais sobre o jesuíta, proferirá a conferência "Vieira, caminheiro dos mares". Em seguida, enquadrado no esplendor do cenário, o Conservatório Regional de Ponta Delgada apresentará um recital de música barroca.

Nos dias 16 e 17, os trabalhos do Colóquio prosseguirão no Anfiteatro C da Universidade, repartidos em duas sessões diárias com início às 9h30 e 14h30.

Com este colóquio, a Universidade dos Açores integra-se nas comemorações "2008 Ano Vieirino", ao mesmo tempo, esta iniciativa lembra que as ilhas açorianas gozaram o privilégio de escutar a pregação do Jesuíta que, à época, subira já a alguns dos mais prestigiados púlpitos de importantes cidades europeias, e no Brasil pugnava arduamente pela defesa dos índios. E lembra ainda que, embora a inclusão dos Açores, "terra onde os montes são vivos", na rota e na vida do Padre António Vieira não tenha resultado de um projecto voluntário, veio a assumir um significado de que o próprio jesuíta se apercebe e acentua em diversas ocasiões e passos da obra.

Reconhecendo a importância do Colóquio, que promove o estudo pluridisciplinar de várias dimensões da obra de uma personalidade fundamental da nossa cultura, a DRCT apoia a sua realização, enquanto a Secretaria Regional da Educação e Ciência concede creditação como formação contínua específica aos professores do ensino básico e secundário que nele participarem.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

"Línguas e Culturas - Olhares Cruzados"

DE ROSTOS.PT

“Línguas e Culturas – Olhares Cruzados”

No âmbito do Ano Internacional para o Diálogo Intercultural, o Centro de Saberes de Montijo vai dar início a um novo ciclo de conferências intitulado “Línguas e Culturas – Olhares Cruzados”.

A presidente da Câmara Municipal de Montijo, Maria Amélia Antunes, e Inês Duarte, vice-reitora da Universidade de Lisboa, vão estar presentes na abertura do novo ciclo de conferências, no próximo dia 26, sexta-feira, pelas 18h00, na Galeria Municipal.

A primeira conferência “ Quando uma língua vive em diferentes culturas” será presidida por Maria Helena Mira Mateus (...).

Em seguida, “Padre António Vieira: da Missão à Politica” é o tema da conferência proferida por Arnaldo Espírito Santo, professor catedrático da FLUL – Estudos Clássicos. Arnaldo Espírito Santo ocupa, actualmente, os cargos de vice-presidente da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e de presidente do Departamento de Estudos Clássicos.

Recorde-se, que o Centro de Saberes do Montijo foi instituído pelo convénio celebrado entre a Câmara Municipal de Montijo e a Universidade de Lisboa em Dezembro de 2004.

23.9.2008

sábado, 13 de setembro de 2008

Vieira e o Brasil

Para comemorar os 400 anos de nascimento do Padre Antonio Vieira, o Pátio do Colégio apresentará nos próximos fins de semana, filmes nacionais que retratam o período em que o jesuíta realizou sua missão. A entrada é grátis.

Neste sábado (13/9) e também no dia 27/9, às 14h o público poderá conferir “A Batalha dos Guararapes, o Príncipe de Nassau”, de Paulo Thiago, traz um Brasil holandês e a poesia de Gregório de Mattos na sociedade baiana de 1601 e leva o público a conhecer um pouco do contexto do século 17 de Vieira.

No dia 20 (sab) e 28/9 (dom), será a vez da diretora Ana Carolina com seu filme “Gregorio de Mattos”.

Serviço
Pátio do Colégio – Sala Manuel de Paiva
Praça Pátio do Colégio, 2
Tel.: 3105-6899
Sab (13/9), às 14h
Grátis
www.pateocollegio.com.br
Metrô Sé

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

António Vieira

António Vieira - Britannica Concise Encyclopedia Date: 2007
(born Feb. 6, 1608, Lisbon, Port.—died July 18, 1697, Salvador, Braz.)

Portuguese-born Brazilian missionary, orator, diplomat, and writer. He was raised in Brazil, where he became a Jesuit priest. His sermons exhorting all races to join in repelling Dutch invaders are considered the first expression of the Brazilian concept of forming a new race of mixed blood. He worked among the Indians and black slaves until 1641, mastering several of their languages. Returning to Portugal, he became an important figure in the court of John IV, where he advocated toleration for Jewish converts to Christianity. He was imprisoned by the Inquisition (1665–67) but returned to Brazil in 1681.Copyright 1994-2007 Encyclopedia Britannica, Inc.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Espectáculo cénico-musical em S. Paulo

De "Globo Livros"

Emocionante. Foi a palavra mais repetida pelos espectadores que amorosamente invadiram os bastidores após a apresentação do espetáculo cênico-musical Vieira 400 anos, promovido pelo SESC-SP com o patrocínio da Editora Globo e do Instituto Camões em comemoração ao quarto centenário de nascimento desse autor que Fernando Pessoa chamou de "o imperador da língua portuguesa".

A comoção causada pelos sermões de Antônio Vieira (1608-1697), porém, não foi superficial ou fácil. A exuberância de sua oratória, ainda hoje capaz de proporcionar saborosos momentos de deleite estético, foram emolduradas pela criatividade de Anna Maria Kieffer, que assina a concepção artística e a direção musical do evento.

Eletroacústica, canto gregoriano, coro de câmara e solistas entoaram composições especiais e peças da tradição religiosa luso-brasileira num impressionante diálogo com trechos dos sermões escolhidos por Joaci Pereira Furtado (dono da idéia que originou o espetáculo), lidos pelo ator português Luís Lima Barreto, do Teatro da Cornucópia, de Lisboa, além da iluminação especificamente desenhada para a ocasião e dois arranjos florais inspirados nas pinturas do holandês Albert Eckout, contemporâneo de Vieira que viveu em Pernambuco.

A capela do beato José de Anchieta, no Pátio do Colégio, marco fundador da cidade de São Paulo, estava lotada naquela tarde de sábado, 2 de agosto de 2008. Repleta de emoção.

Veja as fotos do espectáculo

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Seminário sobre Vieira em Belo Horizonte

Estão abertas as inscrições para o seminário em comemoração ao 4º centenário de nascimento do Pe. Antônio Vieira, realizado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, através do Centro de Estudos Luso-afro-brasileiros (CESPUC) em parceria com o Instituto Camões.

O evento, marcado para os dias 27, 28 e 29 de agosto, vai reunir em Belo Horizonte especialistas na obra do autor, que é considerado pertencente tanto à literatura portuguesa quanto à brasileira.

Além de missionário, Padre Antônio Veira foi orador, diplomata, mestre da prosa portuguesa clássica e teve papel importante na história portuguesa e brasileira.

Seus sermões, cartas e papéis oficiais constituem um valioso índice do clima das opiniões no século 17 no mundo luso-brasileiro.

Entre os palestrantes, vale destacar as presenças de estudiosos como Paulo Borges, da Universidade de Lisboa, José Américo Miranda, da UFMG, João Adolfo Hansen, Adma Muhama e Anita Novinsky, da USP, Alcir Pécora, da Unicamp, Ângela Vaz Leão e Audemaro Taranto Goulart, da PUC Minas.

Haverá também debates, mesas-redondas e sessões de comunicações, além da exibição do filme de Manoel de Oliveira "Palavra e utopia", a ser comentado pelo crítico de cinema Marcelo Castillo Avelar.

O encontro será encerrado com a conferência do escritor Affonso Ávila, autor da publicação "O barroquismo no sermão de Vieira".Outras informações podem ser obtidas pelo telefone (31) 3319-4368 ou no portal http://www.pucminas.br/

In "Portugal Digital" 4.8.08

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Paulistano vence prémio luso-brasileiro de dramaturgia

In Alagoas em Tempo Real, 28.7.08

A peça The Cachorro Manco show, de autoria do paulistano Fábio Mendes, é a vencedora do 2º Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva, concedido pela Funarte e o Instituto Camões, de Portugal. Além de receber um prêmio de 15 mil euros, o autor terá seu texto editado em livro e encenado no Brasil e em Portugal. O português Armando Nascimento Rosa foi distinguido com Menção Honrosa, por unanimidade, pelo texto Visita na prisão.

Fábio Mendes estreou como roteirista com a peça Um homem chamado Lee e participou da equipe de criação da série de TV Alice (HBO). Cachorro Manco é um monólogo cômico, que ele considera uma "mistura de stand up comedy com sermão". Na trama, um cachorro vira-lata luso-brasileiro conta suas histórias, tentando convencer um novo dono a lhe oferecer um prato de comida e uma noite dentro de sua casa.

O cachorro usa de retórica própria e discorre sobre o amor, sobre sua relação com seus antigos donos (Deus), sobre a língua portuguesa e, acima de tudo sobre a relação entre Brasil e Portugal - explica Mendes, que trabalhou como ator com os dramaturgos Antunes Filho e Gerald Thomas, apresentando-se nos Estados Unidos e na Espanha, e como diretor, no curta-metragem Magenta, de sua autoria.

A comissão julgadora do prêmio elegeu o vencedor por meio da análise de oito textos finalistas, quatro portugueses e quatro brasileiros, em videoconferência realizada no dia 18 de julho de 2008.

O júri foi composto por Carmem Cinyra Gadelha (RJ), pesquisadora teatral; Edwaldo Cafezeiro (RJ), professor da Uni-Rio; Fernando Queiroz (DF), PhD em teatro e performance pela Universidade de Londres e professor da Universidade de Brasília; Pedro Mexia, crítico e poeta (Lisboa); Rui Mendes, ator de teatro, cinema e TV (Lisboa); e Sebastiana Fadda, crítica de teatro, tradutora e mestre em Literaturas Românicas pela Universidade de Lisboa.

Os participantes foram convidados a apresentar trabalhos inspirados na obra de Padre Antônio Vieira, em comemoração ao quarto centenário de nascimento do jesuíta. Nascido em Portugal, Vieira morou grande parte de sua vida no Brasil, onde defendeu os direitos dos indígenas e escreveu sermões que se tornaram referência para o barroco brasileiro. O vencedor Fábio Mendes conta que não teve medo de editar os discursos do padre, nem de tirá-los de seu contexto, e acredita que conseguiu dialogar com "esse que é um dos pilares da Língua Portuguesa". "Nossa língua não é morta!", defende Mendes.

O Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia Antônio José da Silva, promovido pela Funarte e pelo Instituto Camões, de Portugal, tem o objetivo de incentivar a escrita dramática, estimular o aparecimento de novos escritores de língua portuguesa e reforçar a cooperação entre Brasil e Portugal.

domingo, 20 de julho de 2008

Exposição bibliográfica do padre António Vieira

A Presidência do Governo dos Açores vai assinalar os 400 anos do nascimento do padre António Vieira com a organização de uma exposição bibliográfica e de duas conferências sobre a vida e obra do mais celebrado orador português.

Intitulada “Padre António Vieira: O Eco das Palavras”, a mostra relativa ao autor de uma vasta obra especialmente conhecida pelo vigor e lógica dos seus famosos sermões, vai abrir em Outubro, estando patente na Biblioteca Pública e Arquivo de Ponta Delgada até Fevereiro de 2008.

Em Novembro, Horta e Angra do Heroísmo recebem duas conferências organizadas pela Centro do Conhecimento dos Açores – “António Vieira, uma coincidência oppositorum da sua vida e da sua escrita” (Aníbal Pinto Castro) e “Vieira e Pessoa” (Yvette Centeno), a 12 e 13, respectivamente.

O padre António Vieira nasceu em Lisboa em 1608 e morreu na Baía em 1697, desenvolvendo uma intensa e polémica intervenção no processo de colonização do Brasil.

JORNAL DIÁRIO 20.7.08

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Morte de António Vieira

No dia 18 de Julho de 1697, morreu o padre António Vieira.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Vida de Vieira representada nas Ruínas do Carmo

Os momentos mais importantes da vida do Padre António Vieira (1608-1697) vão ser representados nas Ruínas do Carmo, em Lisboa, no espectáculo "Vieira - O Céu na Terra", que se estreia terça-feira.

"Vieira - O Céu na Terra", da autoria de Miguel Real e Filomena Oliveira, é uma produção do Teatro Nacional D. Maria II inserida nas comemorações do IV centenário do nascimento do religioso e famoso pregador português.

"Em Lisboa, na corte de D. João IV, no Brasil entre os colonos ou entre os índios do sertão, revela-se o homem de plurais actividades - missionário, diplomata, político, orador, profeta, escritor, nacionalista", refere a sinopse de "Vieira - O Céu na Terra".

"É um homem que morre fracassado (as suas profecias não se cumpriram), mas feliz, cheio de esperança. Era um homem de mil projectos, de mil actividades", acrescentou, em declarações à Lusa, o autor do texto.

António Vieira nasceu em Lisboa e aos 6 anos foi viver para o Brasil porque o pai foi destacado para o cargo de escrivão, em Salvador.

Estudou no Colégio dos Jesuítas e juntou-se à Companhia de Jesus, tendo ao longo da sua vida defendido várias causas humanitárias e chegado a ser preso por ordem do Santo Ofício.

A peça "vai fixar três aspectos da obra do padre António Vieira: a sua sede de justiça social - com a defesa dos judeus perseguidos pela Inquisição e dos índios e escravos no Brasil - o aspecto profético (do V Império como união dos povos) e a eloquência da sua oratória", disse Miguel Real.
Filomena Oliveira, o outro elemento desta dupla de autores, trabalhou a encenação e desde logo destacou o "espaço fortíssimo" sugerido pelo director do D. Maria II, Carlos Fragateiro, para este espectáculo - as Ruínas do Carmo.

"A nave central é utilizada para a representação e o público fica lateralmente", explicou a encenadora, acrescentando que se pretende que os espectadores se sintam transpostos para ambientes do século XVII, seja uma igreja de Lisboa ou o sertão brasileiro.
A mudança é feita sobretudo através dos jogos de luz, das cores e das formas, que permitem "uma constante transformação das Ruínas do Carmo", apontou Andrzej Kowalski, responsável pelo espaço cénico e imagem.

Num elenco com 15 actores, a figura do Padre António Vieira será representada por José Henrique Neto enquanto João Lagarto faz de inquisidor.

O espectáculo será apresentado até 16 de Agosto e o Teatro Nacional D. Maria II vai depois apresentá-lo no Brasil, entre Novembro e Dezembro, no âmbito das comemorações dos 200 anos da chegada da família real, disse à Lusa Carlos Fragateiro.

AGÊNCIA LUSA 17.7.08

domingo, 13 de julho de 2008

Vieira na obra de Inês Pedrosa


Em seu primeiro romance ambientado no Brasil, A Eternidade e o Desejo, (Alfaguara, 185 págs., R$ 29,90), lançado na 6ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), a escritora portuguesa Inês Pedrosa presta sua homenagem aos 400 anos do padre Antônio Vieira ao contar o drama de uma historiadora e professora universitária portuguesa. Clara aceita viajar ao Brasil acompanhada de um amigo, Sebastião, e refaz os passos do visionário jesuíta, relembrando uma antiga paixão que a levou à cegueira ao tentar defender um professor da fúria de um marido traído, que atirou em seu amado. Inês, a exemplo de Saramago, usa a cegueira de Clara como metáfora da dificuldade de percepção do real. A perda da visão levaria a uma reflexão sobre as palavras de Vieira a respeito do sentido da eternidade como sinônimo do desejo, tema da conversa de Inês Pedrosa com o Estado, publicada a seguir.
O uso dos sermões de Vieira quase como uma ilustração em A Eternidade e o Desejo parece buscar obsessivamente uma correspondência entre a palavra e a imagem. Você escolheu os sermões pelas imagens que evocam? Era esse seu propósito?
Justamente. Quando li os sermões do padre, não percebi que ele também falava do desejo. Interessei-me no contraste desses sermões com a época contemporânea porque Vieira foi um visionário e perguntei-me como não se conhece nenhuma relação carnal, íntima, sua, sendo ele um homem tão sanguíneo, visceral, pouco identificado com um temperamento contemplativo. O sermão da Nossa Senhora do Ó me deu a resposta para isso: a eternidade e o desejo são a mesma coisa. É uma frase completamente contemporânea, muito pouco barroca, sobretudo considerando que é do século 17. Esse sermão fala dos desejos de uma grávida, mas, como em todos os sermões, também de uma pequena ignomínia terrena que depois extravasa. Cada ignomínia é a ignomínia, cada desejo é desejo. Foi por isso que me apeguei a essa frase que une a eternidade ao desejo.
Vieira também fala dessa contradição que é nossa aspiração pela eternidade e o desejo de que as coisas acabem. Ou temos a consciência de sermos mortais sem desejarmos a eternidade, sendo infelizes, ou o contrário, o que traz a angústia da infelicidade eterna.
Sim. Tive uma educação católica e ainda me lembro dos livros de catequese com imagens do inferno em chamas e demônios picando pessoas de rostos desfigurados, contrastando com a imagem do paraíso, onde tudo eram flores, pessoas encantadas. Eu, que nunca me acostumei a ficar quieta, estava lá a contemplar, morrendo de tédio. Lembro que queria ir para o purgatório, onde, afinal, podia acontecer alguma coisa. Agora, a pequena eternidade que temos em vida basta-me. Agustina Bessa-Luís me confidenciou que não se apega demasiadamente nem às pessoas nem aos gatos. Tinha um gato que ela adorava e, durante uma viagem, ele, inquieto, deixou Agustina irritada. Ela, então, pediu ao marido que parasse o carro e colocou o gato para fora, apesar de todo apego que sentia por ele. Não tenho tantos anos quanto Agustina, mas entro numa fase da vida em que já perdi muitos amigos e vejo-me como o Orlando de Virginia Woolf, viajando pelos séculos sem criar empatia com ninguém, o que tampouco é fascinante. Acho que a eternidade possível é esta de não perder o desejo, o que é muito difícil. No fundo, a eternidade é a manutenção do deslumbramento. Infelizmente, vivemos num mundo globalizado em que se imagina que nada mais possa surpreender.
O padre Vieira é um personagem controvertido também por suas idéias e posições políticas, que o levaram a ser perseguido pela Inquisição. Você acabou de destacar sua vocação visionária, mas é preciso lembrar que seu Quinto Império pode também ser lido como um nostálgico sebastianismo. Você, que é uma mulher engajada, que defende o aborto, o casamento entre homossexuais e apoiou o candidato Manuel Alegre nas últimas eleições, como vê esse lado político de Vieira?
Acho que, se Vieira fosse vivo, ele certamente teria um blog. Ele é mesmo um personagem polêmico. Participei recentemente de um seminário sobre o padre e houve protestos de acadêmicos, escandalizados com as homenagens aos 400 anos de um homem que eles consideram um escravagista, apesar de ter lutado pela independência dos índios. É curioso: ele tinha um lado idealista e outro muito pragmático. Criou a primeira companhia de comércio com o Brasil numa época em que não era possível fazer a exploração econômica do país sem a escravatura. Pode-se criticá-lo, mas ele foi, decididamente, um visionário, tendo, por exemplo, sido um extremo defensor dos judeus.
Voltando ao romance, não haveria uma tendência na literatura portuguesa de abusar da metáfora, o que talvez seja uma herança barroca? Digo isso por conta da cegueira da principal personagem, Clara, cujo nome, aliás, já traduz uma intenção alegórica. Lembro que também Saramago usa igualmente a deficiência visual em Ensaio Sobre a Cegueira como sinônimo de falta de percepção do real.
Acho que talvez tenha mesmo a ver com a tradição barroca. Fala-se muito da poesia, mas acredito que nossas primeiras peças literárias sejam as crônicas de viagem de Fernão Lopes, que tinha uma grande inclinação para a metáfora. O barroco tem a ver com o absolutismo real e, portanto, com um certo medo que atravessou a história de Portugal, um respeito atávico pelo poder, um hábito de transformar as palavras de modo a não ser prejudicado por elas. Talvez seja por isso que me sinto tão tocada pela literatura brasileira. Em Portugal, tratar de sexo pode ser arrepiante, sobretudo se for uma escritora mulher. Maria Teresa Horta, uma poeta cuja obra é centrada na experiência erótica, nunca é convidada para nenhum congresso ou encontro. O ato sexual, de forma geral, em Portugal, nunca é descrito sem recorrer a metáforas. Por outro lado, acho que a metáfora ainda é uma das grandes forças expressivas da língua portuguesa.
Sei que você é uma opositora do acordo ortográfico, por considerar que ele provoca, na verdade, um desacordo, criando uma outra língua. Noto que os escritores portugueses são mais lidos no Brasil que os brasileiros em Portugal. Não há um desequilíbrio aí?
Só para falar de um escritor de quem gosto bastante, Bernardo Carvalho tem sido publicado por várias editoras portuguesas e até o Luiz Ruffato, que tem uma escrita experimental, já foi publicado. Outros grandes autores como Milton Hatoum e Raduan Nassar têm críticas boas nos jornais, mas a crítica já não tem poder, se é que algum dia teve. Digo que, se o dinheiro investido no acordo ortográfico fosse gasto com companhias aéreas para levar os autores brasileiros a Portugal, estou convencida de que seria melhor. Isso vai mudar. Aqui, na Flip, estão dois grandes editores portugueses que não vieram acompanhar seus queridos escritores, mas para farejar autores para futura publicação em coleções dedicadas aos brasileiros.
Você tem outro livro que se passa no Brasil, ainda inédito por aqui, também sobre o padre Vieira. É o livro que relata sua excursão pelo Brasil atrás da trajetória do padre, não?
Sim, chama-se No Coração do Brasil. É o relato dessa viagem que fiz em 2005. Não tinha interesse em produzir um livro sobre a excursão, então resolvi escrever seis cartas de viagem para cada um dos lugares que visitei no Brasil, revelando como os vejo agora e como deveriam ser no tempo dele. Fiquei muito feliz com os comentários de que ele parece escrito no tom do padre Vieira. Portanto, ficou um bocadinho como o século 17.
E, dos autores contemporâneos, quem você considera que levou adiante a mensagem do padre?
Nunca pensei nisso, mas acho que foi Fernando Pessoa, que chamava o padre de ''o imperador da língua''. Manuel Alegre seria também seu herdeiro, mas é um poeta diminuído pela crítica por não estar numa torre de marfim, idéia também que o Lobo Antunes vende, como se ao escritor fosse permitido escrever mas não participar da sociedade. Eu também tenho sido muito criticada por minha atuação política. Acusam-me de autopromoção. Pensando fora de Portugal, lembro do francês Paul Claudel e do Fernando Savater, até porque é alto, barbudo, corajoso e vai fundo em suas críticas que colocam a si e a seus filhos sob ameaça.
Entrevista de António Gonçalves Filho, no Estado de S. Paulo, 13.7.08

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Vieira na "Encyclopaedia Britannica"

António Vieira - Portuguese author and diplomat

born Feb. 6, 1608, Lisbon, Port. died July 18, 1697, Salvador, Braz.

Jesuit missionary, orator, diplomat, and master of classical Portuguese prose who played an active role in both Portuguese and Brazilian history. His sermons, letters, and state papers provide a valuable index to the climate of opinion of the 17th-century world.

Vieira went to Brazil with his parents as a child of six. Educated at the Jesuits’ college in Bahia, he joined the Society of Jesus in 1623 and was ordained in 1635. He soon became the most popular and influential preacher in the colony, and his sermons exhorting the various races to join the Portuguese in arms against the Dutch invaders of Brazil (1630–54) are considered the first expression of the Brazilian national mystique of forming a new race of mixed bloods. In addition to the Tupí-Guaraní tongue, the lingua franca of the Brazilian littoral, Vieira learned a number of local Amazon dialects and the Kimbundu language of the black slaves who had been brought to Brazil from Angola.

Vieira worked among the Indians and black slaves until 1641, when he went with a mission to Portugal to congratulate King John IV on his accession. The king soon fell under the spell of Vieira’s self-assured and magnetic personality and came to regard the tall, lean, dynamic Jesuit as “the greatest man in the world.” The king made him tutor to the infante, court preacher, and a member of the royal council. Vieira’s devotion to the king was such that after John’s death (1656) he formed a fixed idea that the king would return to inaugurate a prophesied golden age of peace and prosperity.

Between 1646 and 1650 Vieira was engaged in diplomatic missions to Holland, France, and Italy. But by his outspoken advocacy for toleration for Jewish converts to Between 1646 and 1650 Vieira was engaged in diplomatic missions to Holland, France, and Italy. But by his outspoken advocacy for toleration for Jewish converts to Christianity in Portugal and because of his willingness to cede Pernambuco to the Dutch as the price of peace, he made enemies in Portugal. By 1652 it had become prudent for him to leave the country for Brazil. His denunciation of slave-owning there resulted in his return to Lisbon in 1654. During his stay in Portugal, he secured decrees protecting the Brazilian Indians from enslavement and creating a monopoly for the Jesuits in the government of the Indians, and he returned triumphantly in 1655. He resumed his apostolic mission in Maranhão and on the Amazon delta, where for six years he traveled widely and laboured energetically before being forced back to Lisbon in 1661. For prophesying the return of John he was condemned by the Inquisition and imprisoned (1665–67).

On his release (1668) he went to Rome, where he succeeded in securing at least temporary toleration for the converted Jews. He remained there for six years, becoming confessor to Queen Christina of Sweden and a member of her literary academy. In 1681 he returned to Bahia, where he remained, a fighter for the freedom of the Indians, until his death at 89.

Vieira is claimed as a literary master by both the Portuguese and the Brazilians. Though his prose style, in its ornateness, Latinisms, and elaborate conceits, is a product of the Old World, his works are of the New World in their emotional freedom, boldness of thought, and advanced attitude of racial tolerance.

Assorted References
Brazilian history ( in Brazil: Royal governors, Jesuits, and slaves ) Portuguese literature ( in Portuguese literature: The 17th century and the Baroque )

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Sermão de Vieira por Luis Miguel Cintra


No sábado, 12 de Julho, pelas 18h00, terá lugar o espectáculo "Padre António Vieira - Sermão de Quarta-feira de Cinza", com leitura por Luís Miguel Cintra, nos Claustros do Museu Alberto Sampaio, em Guimarães, com entrada gratuita.

1672 - Em Roma, na Igreja de S. António dos Portugueses, o Padre António Vieira faz uma profunda reflexão sobre um dos temas mais frequentes da arte barroca: a morte, a efemeridade da vida e as vaidades humanas, como glosa da citação bíblica da Liturgia de quarta-feira de cinzas, na cerimónia de imposição das cinzas: Memento Homo, quia pulvis es, et in pulverem reverteris. (Lembra-te, ó homem de que és pó e ao pó hás-de voltar.) A própria Igreja não escapa à advertência de Vieira: “… homenzinhos miseráveis, loucos, insensatos, não vedes que sois mortais? Não vedes que haveis de acabar amanhã? Não vedes que vos hão-de meter debaixo de uma sepultura, e que de tudo quanto andais afanado, e adquirindo, não haveis de lograr mais que sete pés de terra?” Um dos mais belos e terríveis sermões do Padre António Vieira, um dos melhores exemplos da grande arte oratória portuguesa do século XVII.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Inês Pedrosa lança no Brasil obra com referências de António Vieira

A escritora Inês Pedrosa lança a 8 de Julho no Rio de Janeiro o seu romance "A Eternidade e o Desejo", com a chancela da editora espanhola Alfaguara, fortemente implantada na América Latina, anunciaram hoje as Publicações D.Quixote

O poeta, ensaísta e letrista António Cícero apresentará o livro na Casa do Saber, numa sessão que contará com a presença da autora, convidada a participar na VI Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), que decorre entre quarta-feira e domingo.

A Eternidade e o Desejo, editado em Novembro passado em Portugal pela Dom Quixote e que vai já na terceira edição, é o primeiro romance de Inês Pedrosa cuja acção se desenrola no Brasil.

Ao longo da obra, a escritora revisita os lugares percorridos pelo Padre António Vieira, pela mão das personagens Clara e Sebastião - uma ideia surgida durante uma viagem que fez ao Brasil em 2005, a convite do Centro Nacional de Cultura.
Em "O SOL", 1.7.08

sexta-feira, 27 de junho de 2008

TV SEnado do Brasil apresenta programa sobre Vieira

A TV Senado apresenta, neste final de semana, uma reportagem especial em homenagem aos 400 anos de nascimento do Padre Antônio Vieira. A produção viajou até São Luís (MA) e Salvador (BA) para reconstituir a trajetória do padre jesuíta português, que se tornou conhecido pela defesa dos direitos humanos dos povos indígenas e judeus e pela luta pela abolição da escravatura. Além do diretor do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp (Universidade de Campinas), Alcir Pécora, e do antropólogo da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) Luiz Felipe Baêta Neves, o ator Pedro Paulo Rangel, que interpretou Vieira no teatro, também participa da reportagem, que vai ao ar às 15h30 deste sábado (28) e às 15h30 e 21h deste domingo (29).

terça-feira, 3 de junho de 2008

Entrevista ao Pe. Geraldo Antônio Coelho de Almeida, S.J.

(Entrevista por Alexandre Ribeiro em "Zenit - o mundo visto de Roma", 3.6.08, Permalink: http://www.zenit.org/article-18629?l=portuguese)



Em momentos em que se celebra em Portugal e no Brasil o IV centenário de nascimento do Pe. Antônio Vieira, considerado por Fernando Pessoa o «imperador da língua portuguesa», Zenit conversou com um jesuíta sobre o legado do pregador e missionário.


Quem concede a entrevista é o padre Geraldo Antônio Coelho de Almeida, S.J., reitor do Pontifício Colégio Pio Brasileiro em Roma, que foi diretor do Colégio Antônio Vieira em Salvador (Bahia, Brasil).


--Por que não tem se falado tanto do quarto centenário do nascimento do Pe. Antônio Vieira?


--Pe. Geraldo Coelho de Almeida: Não se fala muito do quarto centenário de nascimento de Vieira porque onze anos atrás já se celebrou um centenário, o terceiro de sua morte. Vieira teve uma vida longa. Diante disso, onze anos depois já estamos celebrando o quarto centenário do seu nascimento. A probabilidade maior é que ele tenha nascido no dia 6 de janeiro de 1608 e morrido no dia 18 de julho de 1697. Portanto, viveu 89 anos e alguns meses. Vida longa para a época.


--Como foi a vida de Antônio Vieira?


--Pe. Geraldo Coelho de Almeida: Ele teve uma vida muito movimentada. Nasceu em Lisboa e ainda criança veio para o Brasil. A família passou pelo Rio de Janeiro, depois se fixou em Salvador. E ali ele fez os estudos primários e secundários. Com 15 anos, ele já ingressava na Companhia de Jesus. Depois do noviciado, fez os outros estudos, de humanidades, filosofia e teologia. Tudo no Brasil. Tudo que Antônio Vieira estudou regularmente, digo regularmente porque ele era um aficcionado por biblioteca, onde encontrava livros ia lendo. Evidentemente, quando ele foi para Portugal, depois para Itália, vasculhou tudo quanto era biblioteca que havia naquele tempo. Os livros eram um produto muito raro e caro. Mas havia bibliotecas selecionadas. E certamente por conta própria, ele estudou a vida toda. Porém, todos os estudos regulares foram feitos no Brasil. Ele chegou aqui com cerca de 7 ou 8 anos e estudou no colégio da Companhia de Jesus que havia em Salvador. Era o principal dos colégios no Brasil naquela época. Entrou no noviciado lá mesmo.


--Como se manifestou seu talento como escritor?


--Pe. Geraldo Coelho de Almeida: Durante a invasão holandesa em 1624-1625, ele foi encarregado de escrever um relatório sobre a invasão, e o fez num estilo caprichado, em latim, com muitos pormenores. Esse documento atualmente é considerado um dos mais importantes para se compreender o que aconteceu durante aquela invasão a Salvador. Portanto, desde jovenzinho, ele já se revelava uma pessoa com grandes dotes literários e com grande inteligência.
Existe uma lenda que diz que ele tinha grande dificuldade para argumentar, e que ele chegava à aula e, na hora de argumentar, não sabia. Então todo dia ele passava pela igreja do colégio e, diante da estátua de Nossa Senhora das Maravilhas que existe lá ainda hoje, ele fazia uma oração pedindo a graça de compreender as coisas com mais rapidez, mais inteligência. Um belo dia teria dado um estalo na sua cabeça e, a partir daquele instante, ele chegou à aula e pediu para argumentar. Para surpresa de todos, foi um assombro. Isso se conta na biografia dele. Mas ninguém sabe se é uma lenda.


Pode até ter sido que um dia ele tenha sofrido algo especial e a partir desse momento tenha dado uma guinada na sua vida em termos de compreensão das coisas. O certo é que desde cedo se manifestou seu talento. E há provas disso, como o documento que eu citei, que data do noviciado.


--E a sua atividade como orador?


--Pe. Geraldo Coelho de Almeida: Antônio Vieira, quando se ordenou, já tinha se revelado um grande orador. Ele já tinha surpreendido as pessoas em Salvador com a sua oratória. Em Portugal, naquele tempo, assumiu o trono o duque de Bragança, que passou a se chamar Dom João IV, terminando assim a dominação espanhola, que tinha começado em 1580, e seguiu até 1640. Então Dom João IV assume em 1640.


Para prestar a homenagem da colônia, foi criada uma comissão, e Vieira foi incorporado no grupo. E quando chegou lá, ele impressionou tão bem o rei que a partir dali assumiu importante papel junto da nova etapa do reino de Portugal, depois daquele eclipse de 60 anos da dominação espanhola. Durante o período em que ele esteve assessorando o rei, ele recebia missões cada vez mais empenhativas. O rei o nomeou em dado momento embaixador plenipotenciário junto a várias cortes da Europa, com a função de apresentar o novo governo de Portugal. Havia muita dificuldade de aceitação do novo governo, porque a Espanha era muito poderosa, e vários países não queriam criar problemas com ela. Antônio Vieira tinha como missão ir à França, aos Países Baixos, à Itália, para apresentar o rei de Portugal. Não podemos dizer que ele teve sucesso, porque não tinha nenhum preparo diplomático específico. Baseava-se só em sua capacidade dialética e na sua retórica, mas isso não bastava. Como sacerdote, ele não tinha experiência nessa área. Diante disso, algumas missões não foram bem sucedidas. Mas, de qualquer maneira, ele teve esse papel passando por essas várias cortes.


--Depois disso ele voltou ao Brasil?


--Pe. Geraldo Coelho de Almeida: Mais tarde em Portugal ele consegue vir para o Maranhão (Brasil). Ele começou a missão no Maranhão. A missão já estava engatinhando, no lugar que hoje não é o Maranhão apenas, pois chamava-se Maranhão e Grão-Pará. Era o norte do Brasil, que compreendia os estados do Maranhão, Pará e por extensão também a Amazônia, cujos contornos não estavam ainda bem definidos. Então ele vai para o Maranhão. É a alma da missão dos jesuítas no Maranhão. Ali ele escreve cartas, documentos. O regulamento das missões que é atribuído a ele. O certo é que ele encontra também muita inimizade lá, porque os colonos não aceitavam interferência. Ele ficou do lado dos índios e enviava para Portugal cartas narrando os maus-tratos dos índios, a não observação das normas reais que existiam. Três vezes ele foi expulso de lá e também os jesuítas. Vieira foi até preso nesse tempo tumultuado. Finalmente, ele é mandado de volta para Portugal.


Nessa nova fase, o rei morre. A rainha é a regente, mas as coisas não estão mais como antes. Nesse tempo, os seus inimigos o acusam de várias coisas, de favorecer os judeus, quem ele realmente sempre defendeu. Pedia que Portugal desse um tratamento diferente aos judeus, que eram perseguidos em toda península ibérica, pois os judeus podiam com o seu dinheiro ajudar na retomada do reino no vigor anterior à dominação espanhola. Baseado nas posições de Vieira, que foram mal interpretadas, seus inimigos montaram um processo e o acusaram perante o Santo Ofício de Portugal. Cada país tinha o seu tribunal do Santo Ofício, que muitas vezes era dominado pelos governantes locais, só que a culpa viria depois a cair sempre sobre a Igreja. Às vezes, a Igreja era alheia à composição daquele tribunal, que era instrumentalizado pelo Estado. No caso em questão, fizeram um processo. O próprio Vieira se defende das acusações, e se defende muito bem. Nessa época, sua fama de grande orador já extrapolava. Naquele tempo que ele veio para o Brasil, ele também brilhou. Há muitos sermões famosos de Vieira que foram feitos no Maranhão, no Pará. O certo é que depois do processo ele foi condenado, mas uma condenação que não era plena. Ele foi proibido de fazer certas coisas, mas não ficou na cadeia. Então ele conseguiu se livrar do processo, porém tinha penas, como, por exemplo, a de não poder pregar. Os jesuítas portugueses, vendo que não havia tanto espaço para Vieira em Portugal, decidiram que era melhor afastá-lo de lá. E arranjaram um motivo. Tinha havido o martírio dos 40 mártires do Brasil, mortos por protestantes franceses em 1570 nas Ilhas Canárias enquanto se dirigiam para o Brasil, e estava em andamento o processo de beatificação desses mártires. Então deram a ele a incumbência de ser o postulador da causa e o enviaram para Roma.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Viagem ao "Brasil do Padre António Vieira"

No IV Centenário do nascimento do padre António Vieira (1608 -2008), a revista "Amar & Servir" promove uma viagem ao Brasil

Conhecer a obra do missionário, escritor e pregador é o objectivo desta uma viagem ao “Brasil do padre António Vieira”, que decorre de 27 de Setembro a 12 de Outubro de 2008. São 15 dias de viagem histórica, cultural, missionária com passagem por locais relevantes na vida e obra do missionário.

São Luís do Maranhão, onde António Vieira pregou o sermão de Santo António aos peixes, em 1654, é um desses pontos de paragem numa deslocação que inclui a visita ao único deserto do mundo com milhares de lagoas. Rio de Janeiro, São Salvador da Baía, local onde António Vieira viveu a infância e foi ordenado sacerdote em 1635 faz parte deste percurso. Hoje os Jesuítas dirigem, em Salvador, o Colégio Padre António Vieira, com 2.500 alunos e o Santuário de Nossa Senhora de Fátima, o primeiro de “Fátima” no mundo.

Acompanha a viagem o padre João Caniço, jesuíta. A viagem tem um custo de 3.750 euros em quarto duplo. Mais informações e inscrições, pelo telefone 217 541 620 ou e-mail.

FÁTIMA MISSIONÁRIA 29.5.08

"Passeio pelo Sagrado"

Um dos dados curiosos em torno da biografia do padre Antonio Vieira é a descrição do famoso “estalo” que o transformou no maior orador sacro da língua portuguesa. Segundo consta, o fato se deu diante de Nossa Senhora das Maravilhas, no Colégio dos Jesuítas da Bahia. Trata-se de uma imagem portuguesa em madeira, que chegou ao Brasil no século XVI, trazida pelo bispo D. Pero Sardinha, e aqui recebeu revestimento em prata. Preservada de várias intempéries – como a invasão holandesa de 1624 –, a peça é uma das relíquias do Museu de Arte Sacra da Ufba, o MAS.

Devido a seu valor cultural, a imagem foi escolhida para estampar a capa do livro que marca o início das comemorações dos 50 anos da casa. O aniversário ainda é em agosto de 2009, mas o MAS quer realizar uma série de atividades para dinamizar sua atuação. “Hoje em dia, a visão de museu abrange o compromisso com o social e com a divulgação da cultura. Eles são espaços onde se reverencia o passado para se projetar o futuro”, afirma o arquiteto Francisco Portugal Guimarães, diretor do MAS desde 1998.

Nesse contexto, insere-se o lançamento da publicação luxuosa, bilíngüe (português-inglês), que foi patrocinada pela Petrobras via Lei Rouanet. Na primeira parte, ela traz informações e fotos sobre a Igreja e o Convento de Santa Teresa D’Avila, o belo e imponente conjunto arquitetônico onde o MAS está instalado e que por si só já justifica um passeio por lá. Fundado pela Ordem dos Carmelitas Descalços e tombado desde 1938 pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), destaca Franscisco, é um dos mais importantes exemplares da arquitetura colonial do século XVII. O imóvel, pertencente à Arquidiocese de Salvador, foi reformado pela Ufba para ser o seu primeiro museu, numa das muitas ações do visionário reitor Edgard Santos.
Depois de apresentar a moradia, o livro traz um apanhado da coleção do MAS, que tem um total de cinco mil peças, pertencentes à própria universidade, à arquidiocese ou a instituições como o Mosteiro de São Bento, Igreja Belém de Cachoeira e Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, emprestadas em regime de comodato. Os exemplares selecionados para o livro foram agrupados em quatro seções: Imaginária, Marfim, Ourivesaria e Pintura. Cada uma delas vem acompanhada de um texto de um especialista sobre o tema.

Entre as preciosidades do acervo, por exemplo, na parte Imaginária, uma Nossa Senhora de Guadalupe, do século XVI, que representa a produção espanhola do período, e as peças em terracota do mestre Frei Agostinho da Piedade – que veio pequeno para Salvador e aqui produziu sua obra, no século XVII. Já na Ourivesaria, o diretor aponta o impressionante conjunto do altar-mor, todo em prata, da antiga Igreja da Sé, incorporado ao altar da Igreja de Santa Tereza. Hoje, um ciclo de palestras desdobra o conteúdo da publicação, com a presença da historiadora Maria Helena Flexor, da museóloga Mercedes Rosa, da escritora Myriam Fraga e dos arquitetos Eugênio de Ávila Lins e Francisco de Assis Portugal Guimarães, que assinam os textos do livro. O evento é gratuito e as inscrições são feitas na hora. O livro será vendido, a partir do próximo mês, na sede do museu, na Rua do Sodré, no centro da cidade, mas ainda não tem preço definido.

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Palestras de hoje
9h - Imaginária: aspectos de sua representação, com a historiadora Maria Helena Flexor10h - Ourivesaria sacra, com a museóloga Mercedes Rosa11h - Marfim: a riqueza que veio do Oriente, com a escritora Myriam Fraga14h - Arquitetura carmelitana: Convento de Santa Tereza D’Ávila com o arquiteto Eugênio de Ávila Lins.15h - Pintura religiosa na cidade do Salvador - Bahia: séculos XVII, XVIII e XIX, com o arquiteto Francisco de Assis Portugal Guimarães
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FICHA
Livro: Museu de Arte Sacra – Universidade Federal da BahiaCoordenação: Francisco de Assis Portugal GuimarãesVenda: a partir de junhoPreço: não definido (182 páginas)

ANA CRISTINA PEREIRA, FOLHA DA BAHIA, 29.5.08

domingo, 25 de maio de 2008

O Padre António Vieira e as Mulheres

«Não quis o Autor da natureza que a mulher se contasse entre os bens móveis. O edifício não se move do lugar onde o puseram; e assim deve ser a mulher; tão amiga de estar em casa, como se a mulher e a casa foram a mesma coisa.» Assim acusava o incansável misógino Padre António Vieira, na sua rejubilante, teatral e moralista parenética, deixando-nos para a eternidade registos sobre a condição da mulher no seiscentismo, e que nos instiga à reflexão sobre a psicologia machista, enformada em palavras e actos, que persiste neste século XXI.

Em plenas comemorações dos 400 anos do nascimento do Padre António Vieira, surge-nos um livro soberbo que inquire, minudente, 47 sermões vieirinhos, no encalço do universo feminino dos séculos XVII/XVIII: «O Padre António Vieira e as mulheres» de José Eduardo Franco e Maria Isabel Morán Cabanas, que acaba de arrecadar o Prémio SHIP – Monografia 2008, instituído pela Sociedade Histórica da Independência de Portugal, com o valor pecuniário de €1.250,00 e um troféu representativo da SHIP. Um justíssimo prémio para um documento essencial da História das Mentalidades acrescido de um incomensurável prazer de leitura.

Bem organizado, permitindo uma consulta eficaz, o livro explana o estudo sobre o mito barroco do universo feminino – mas também uma esplendorosa e vasta incursão pela psicologia do homem de Seiscentos – em 5 grandes capítulos que, por sua vez, se organizam em subcapítulos e estes em alíneas. Ao todo, são 233 páginas de investigação rigorosa e profusamente documentada, marcada pela paixão com que foi feita pelos autores, paixão que contamina o leitor a ponto de a eleger como uma das mais singulares obras que confia o saber com infinito contentamento.

Maria, a redentora e Eva, a pecadora

No mundo androcêntrico de Vieira «a mulher é construída como um ser capaz do melhor e do pior», dizem os autores. Por um lado Maria, a redentora, por quem o jesuíta tem extrema devoção, a utopia, o exemplo espiritual para todas as mulheres; por outro, Eva, «a mãe de todos os viventes», a tentadora, a pecadora, a que desobedeceu a Deus e arrastou consigo o homem, a responsável por ter aberto a «porta do mal na história da humanidade». É nesta dicotomia mariana e eviana, o positivo e o negativo, que Vieira, munindo-se dum «rico e variado elenco de mulheres», aborda o universo feminino, empenhado na persuasão dos ouvintes/leitores, para salgar a terra, eliminando-lhes os vícios.

Na caracterização do universo feminino, anotando-se a segregação da mulher, Vieira aponta-lhes um rol interminável de vícios que, por serem observados nos costumes, mostram-nos a insurreição das mulheres que ousavam certas liberdades numa sociedade que as agrilhoava. Assim surge a acusação ao carácter movediço das mulheres, que Vieira aponta como a sua natureza itinerante que dá azo à tentação, «o gosto de sair», de «andar mais fora do lar do que dentro, encontrando-se aí a causa da sua perdição e da perdição dos homens, pois acerca da mulher cabe dizer que é “tão vagabunda nos olhos como nos passos”».

Defendendo o «recolhimento» ou a «domesticação» da mulher, Vieira apela a que elas sejam submetidas a intensa vigilância, mesmo nas suas idas à igreja por utilizarem o terço «como “terceiro” dos sacrilégios»; intenta-se contra a argúcia feminina que cria «pretextos para sair e enganar os maridos», pois as mulheres são «mestras no pecado da hipocrisia e na procura de artimanhas que sirvam para satisfazer os seus prazeres pessoais», dizendo-o Vieira desta maneira: «Quantas vezes a mulher faz um voto para cumprir na igreja e acaba por encontrar um devoto».

Com a mesma agudeza retórica, o jesuíta mostra-nos possuir uma espantosa sabedoria da psicologia feminina ao apontar muitos outros vícios das mulheres, encontrados no viver quotidiano, como o «apetite desmedido», a ambição, a curiosidade, a vaidade, o egoísmo, entre muitos outros, todos apetites para a leitura desta monografia.

Nota sobre os autores:

José Eduardo Franco é historiador, doutorado pela École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris em "História e Civilização". Tem uma vasta obra de investigação, e é considerado um dos maiores especialistas portugueses sobre a História dos Jesuítas. Actualmente é Presidente da Direcção do Instituto Europeu de Ciências da Cultura P. Manuel Antunes.

Maria Isabel Morán Cabanas é Professora Titular da Faculdade de Filologia da Universidade de Santiago de Compostela, onde lecciona na licenciatura e em cursos de doutoramento e tem inúmeros trabalhos publicados na área da história e crítica da literatura portuguesa e fez a sua tese de doutoramento sobre o "Cancioneiro Geral" de Garcia de Resende. É membro do Graall (Grupo de Análise de Aspectos Linguístico-literários na Lusofonia), da Universidade de Santiago de Compostela.

O Padre António Vieira e as Mulheres – O mito barroco do universo feminino, José Eduardo Franco e Maria Isabel Morán Cabanas; Editorial Campo das Letras, Porto, 2008

Contacto: teresa.kaminhos@gmail.com

In "Kaminhos Magazine" 25.5.08

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Ano Vieirino em Ponta Delgada (2)

A realização de uma sessão solene, o lançamento de um volume de sermões, uma exposição e a inauguração de um novo topónimo na cidade, assinalaram em Ponta Delgada as primeiras comemorações oficiais, nos Açores, do Ano Vieirino.

Segundo o gabinete de imprensa da Câmara Municipal de Ponta Delgada, as comemorações destinadas a assinalar o IV Centenário do Nascimento do Padre António Vieira tiveram lugar na tarde e noite do passado dia 30 de Abril, com a Câmara Municipal de Ponta Delgada a associar-se à Comissão Nacional para as Comemorações do Ano Vieirino, sob o alto patrocínio da Presidência da República e do Patriarcado de Lisboa. Depois da inauguração da placa toponímica “Rua Padre António Vieira”, na freguesia de Arrifes, que registou o nome do Padre Jesuíta nos Açores, o ponto alto das primeiras comemorações deu-se nos Paços do Concelho de Ponta Delgada numa sessão solene em que esteve presente o Bispo de Angra, D. António Sousa Braga.

Na ocasião a presidente da Câmara Municipal, Berta Cabral, congratulou-se com o facto de a autarquia, juntamente com a universidade, terem sido interlocutores desta efeméride nos Açores, uma vez que ela está também a ser assinalada um pouco por todo o país. Berta Cabral afirmou que “Ponta Delgada coloca, de novo, os Açores no mapa da história das ideias e dos eventos culturais, com uma série de iniciativas que irão destacar a vida e a obra do grande pensador português” que foi o Padre António Vieira. Foi em Ponta Delgada que o Padre se inspirou para fazer o sermão a Santa Teresa, mais tarde publicado.

Rui Jorge Cabral in "Açoreano Oriental", 2.5.08

quarta-feira, 30 de abril de 2008

"A escrita do tempo de Vieira"

A partir do dia 6 de Maio, está patente no Museu Municipal da Ribeira Grande, uma exposição documental sobre “A escrita do tempo de Vieira”, promovida pela Câmara Municipal e inserida nas comemorações do ano vieirino.A exposição gira em torno da caligrafia do tempo do Padre António Vieira, com documentos originais do Arquivo Municipal da Ribeira Grande, que ilustram a forma de escrita do século XVII. Para além disso, faz parte da exposição a mostra de livros que falam sobre a vida e obra do Padre António Vieira, que foi um pensador, ensaísta, pregador, defensor dos direitos dos cristão-novo e dos índios do Brasil, consultor real e diplomata. Foi muito polémico na sua época, tendo sido detido pela inquisição.

A exposição está aberta no horário normal do museu, de segunda a sexta-feira, entre as 08h30 e as 17h30.

AZORESDIGITAL 30.4.08

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Ano Vieirino em Ponta Delgada

O descerramento de uma placa toponímica, uma sessão solene evocativa, na Câmara Municipal, com uma conferência, o lançamento de uma publicação e um sarau cultural, concretizam, em Ponta Delgada, a primeira iniciativa açoriana das comemorações do “Ano Vieirino”.

Este conjunto de iniciativas terão lugar já no próximo dia 30 de Abril, em resultado de um protocolo assinado, no passado mês, entre a Câmara Municipal de Ponta Delgada, a Comissão Nacional para as Comemorações do Ano Vieirino, com vista a assinalar o IV Centenário do nascimento do Padre António Vieira.

O programa de 30 de Abril prevê o descerramento da placa toponímica “Rua Padre António Vieira”, na freguesia de Arrifes, a designar a via onde está instalada a “Urbanização da Piedade”, a norte da Rua Cardeal Humberto Medeiros.

Esta inauguração de nova toponímia terá lugar às 18h00 e terá como orador convidado o Presidente da Comissão Organizadora 2008 do Ano Vieirino, Professor Doutor Manuel Cândido Pimentel.

Às 21h00, no Salão Nobre dos Paços do Concelho de Ponta Delgada, terá início uma sessão solene evocativa do Ano Vieirino, em que intervirão a Presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada e o Presidente da Comissão Organizadora do Ano Vieirino.

A evocação ao IV Centenário do nascimento do Padre António Vieira prossegue com uma conferência de Professora Doutora Maria do Céu Fraga, da Universidade dos Açores, subordinada ao tema “O Padre António Vieira nos Açores. Os desígnios da providência”.

Às 21h45 será lançado o Tomo I da Edição Nacional Crítica dos Sermões do Padre António Vieira (Edição da Imprensa Nacional – Casa da Moeda e CEFI (Centro de Estudos de Filosofia). A apresentação desta publicação será feita pelo Professor Doutor José Luís Brandão da Luz, Vice-Reitor da Universidade dos Açores, bem como pelo Professor Doutor responsável Arnaldo do Espírito Santo, Presidente da Comissão Científica 2008 do Ano Vieirino e Coordenador Científico dos Sermões do Padre António Vieira.

A finalizar a sessão solene, haverá um Sarau musical, que terá lugar pelas 22h15 com a pianista Ana Paula Andrade e a soprano Cármen Subica.A ligação da Câmara Municipal de Ponta Delgada às comemorações do Ano Vieirino honra a passagem do Padre António Vieira pelos Açores, designadamente, pela ilha de São Miguel, onde fez na igreja do Colégio, a sua primeira pregação com um sermão que, segundo fontes autorizadas, nunca chegou a ser escrito.

Refira-se que António Vieira chegou, acidentalmente, aos Açores, em 1654, quando o navio em que seguia, entre o Brasil e Lisboa, naufragou, tendo aqui ficado a pregar.Para além da iniciativa do próximo dia 30, as entidades açorianas que se associam às comemorações vieirinas – Câmara Municipal de Ponta Delgada, Universidade dos Açores e a Comissão Nacional para as Comemorações do Ano Vieirino – estão a organizar uma exposição de pintura, a protagonizar por vários artistas plásticos açorianos, que irão pintar quadros alusivos a excertos dos sermões do Padre António Vieira, para serem expostos no último trimestre de 2008. Esta exposição será mostrada inicialmente nos Açores com o objectivo de percorrer vários pontos do país.

Memorial da America Latina comemora Vieira

O Memorial da América Latina, em parceria com o Centro de Estudos Fernando Pessoa, realiza, nos dias 22, 23 e 24 de abril, o Colóquio 400 anos de Padre Antônio Vieira, "Imperador da Língua Portuguesa". Entre os palestrantes estão o advogado e professor Ives Gandra e o escritor Antonio Machado. A entrada é franca.

A abertura, no dia 22, será realizada na Biblioteca do Memorial da América Latina. No dia 23, as palestras acontecerão no Anexo dos Congressistas do mesmo Memorial e, no dia 24, o colóquio terá lugar na Casa de Portugal.

Para dar mais destaque à versatilidade que distinguiu Vieira ao longo da História, os conferencistas convidados abordarão a vida e a obra do padre sob as mais diversas perspectivas, de acordo com suas profissões e experiência de contato com a literatura do autor. De pesquisadores e ensaístas a arquitetos e advogados, todos têm em sua alma um pouco de Vieira para contar e muito a transmitir às novas gerações.

Nascido em Lisboa no dia 6 de Fevereiro de 1608, o Padre Antônio Vieira veio para o Brasil aos seis anos, onde estudou e missionou durante a maior parte da sua vida; escreveu cerca de 200 sermões e mais de 500 cartas, e sua obra foi tão significativa quanto sua vida.

Antônio Vieira destacou-se, não somente como literato, mas também no campo da política e economia. Era um homem à frente de seu tempo, defendeu o direito dos "cristãos-novos" (judeus que eram obrigados a adotar a religião católica para fugir da inquisição) de permanecer em terras portuguesas numa época marcada pela intolerância. Acreditava que Portugal só tinha a ganhar economicamente com os investimentos financeiros dessa classe perseguida. Era também contra a escravização indígena.

Fernando Pessoa refere-se a ele em seu livro "Mensagem" como o "Imperador da Língua Portuguesa". Sua obra tem como característica marcante jogo de conceitos/idéias por meio do uso do raciocínio lógico e da retórica aprimorada. É tido como modelo de prosador e orador até os dias de hoje. Dentre os sermões de destaque temos: "Sermão de Santo Antônio" e "Sermão pelo Bom Sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda". Padre Antônio Vieira morreu aos 89 anos, na Bahia.

Colóquio 400 anos de Padre Antônio Vieira, "Imperador da Língua Portuguesa"

Dia 22 de Abril (terça-feira) – Abertura
Memorial da América Latina – Biblioteca Latino-Americana Victor Civita

19 h Mesa de Abertura
Dr. Fernando Leça (Diretor Presidente da Fundação Memorial da América Latina)
Prof. João Alves das Neves (Presidente do Centro de Estudos Fernando Pessoa)

20h Conferência
Tereza Rita Lopes (Escritora e professora da Universidade Nova de Lisboa): "Vieira e Pessoa"

21h Leitura Dramática de Textos Vieirianos
Carlos Carranca (Professor da Escola Superior de Teatro, Portugal)


Dia 23 de Abril (quarta-feira) – Colóquio
Memorial da América Latina – Anexo dos Congressistas

9h às 10h Conferências: Padre Vieira do Brasil
Regina Anacleto (Professora - Universidade de Coimbra): "A Arte no Tempo de Vieira"
Hernâni Donato (Historiador e professor universitário): "Vieira, o Crente"

10h Intervalo

10:15h às 12:30h Conferências: Recepções de Vieira
José Eduardo Franco (Professor - Universidade Lusófona, Lisboa): "A Mulher nos sermões de Vieira"
Carlos Francisco Moura (Escritor e arquiteto – Real Gabinete Português de Leitura): "Vieira Viajante, Navegante, Naufragante"
Eduardo Navarro (Professor Literatura Brasileira - FFLCH / USP): "A Idéia da Inconstância da Alma Selvagem no Sermão do Espírito Santo"

12:30h Almoço

14h às 16h Conferências: Vieira, o dono da História
Maria Beatriz Rocha-Trindade (Escritora e professora - Universidade Aberta de Lisboa): "O Saudosismo na Literatura Portuguesa"
Raul Francisco Moura (Escritor e museólogo, Rio de Janeiro): "Três Antónios Lisboetas"
Teodoro Koracakis (Professor - Universidade Estadual do Rio de Janeiro): "A Relevância do Sermão da Quadragésima para o Estágio Atual dos Estudos Literários"
Antonio Lopes Machado (Escritor): "O Padre Vieira, Protetor dos Índios e Africanos"

16h Intervalo

16:15 às 18:15 Conferências: Vieira de mil faces
Paulo de Assunção (Professor Titular - USJT/ Unifai/ Inicapital e FAENAC): "O Pensamento Econômico do Padre Antonio Vieira"
Beatriz Alcântara (Professora - Universidade Estadual do Ceará): "Vieira – o Quinto Império e o Saudosismo"
Odete da Conceição Dias (Professora - Universidade Ibirapuera): "Iconografia Vieiriana"

Dia 24 de abril (quinta-feira) – Colóquio e Encontro Cultural de Língua Portuguesa
Casa de Portugal

9h às 12h Comunicações: Recepções Lusófonas no século XX - I
Marcia Arruda Franco (Professora DLCV – Literatura Portuguesa da FFLCH / USP): "Duas Cantigas em Movência"
Flavio Vichinski (Professor e mestrando FFLCH /USP): "Saramago, Leitor de Camões"
Anísio Justino da Silva Filho (Teólogo, professor e mestrando da FFLCH / USP): "A Defesa e a Ilustração da Língua Portuguesa nos Gramáticos e em Antonio Ferreira"
Vera Helena Amatti (Jornalista e mestranda da FFLCH /USP): "A Construção do Sermonista no jovem 'repórter' Antônio Vieira"

12h Almoço

14h às 16h Comunicações: Recepções Lusófonas no século XX - II
Luiz Antônio Lindo (Professor de Filologia Românica da FFLCH / USP): "Caminho e caminharei a passos duros, pensando"
Rita de Cássia Alves (Escritora e ensaísta): "Presença da Saudade na Alma Portuguesa: Vieira e Pessoa"
Cristiane Prando Martini Simeoni (Professora e mestranda (Letras) da FFLCH / USP) "A Desconstrução do Eu em Fernando Pessoa"

Intervalo

16:15h às 18:15h Comunicações: Estudos Lusófonos
Ives Gandra Martins (Escritor e Professor Emérito da Universidade Mackenzie): "A Presença de Vieira no Maranhão e a Integração Futura de uma Nação com a Vinda da Corte Portuguesa"
Carlos Carranca (Professor da Escola Superior de Teatro, Portugal): "O Iberismo: Torga, Unamuno, e a visão da América Latina"
Dalila Teles Veras (Escritora) "A Obra de Joaquim de Montezuma de Carvalho"


Teodoro Antunes Mendes Tamen (Poeta e pesquisador): "O Padre Antônio Vieira e o Sonho do Quinto Império".



Apoio Cultural:

Fundação Calouste Gulbenkian
Biblioteca Nacional de Portugal
Real e Benemérita Associação Portuguesa de Beneficência
Casa de Portugal de São Paulo
Viagens Numatur
Banco Banif

Serviço:
Colóquio 400 anos de Padre Antônio Vieira, "Imperador da Língua Portuguesa"
Data: de 22 a 24 de abril
Memorial da América Latina
Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664, Barra Funda, São Paulo - SP
Tel. (11) 3823-4605
Entrada franca
Inscrições pelo site http://www.memorial.sp.gov.br/
Mais informações: (11) 3823-4780 ou cursos@memorial.sp.gov.br

Casa de Portugal (dia 24/02)
Av. da Liberdade, 602. Tel: (11) 3209-5554

Assessoria de Comunicação: (11) 3823-4605

terça-feira, 8 de abril de 2008

Prémio de Dramaturgia

Armando Nascimento Rosa recebeu o prémio Albufeira de Literatura 2008 – Dramaturgia pela obra “O último sermão de António Vieira”. A cerimónia decorreu no passado sábado, 5 de Abril.

Armando Rosa nasceu em 1966 em Évora. Escreve teatro e não “para teatro”, como costuma dizer, desde há 20 anos. Lecciona na Escola Superior de Teatro e Cinema. São muitos já os êxitos somados. Os seus ensaios, nomeadamente sobre Beckett e António Patrício, são textos de elevada referência não só no panorama intelectual do País como no estrangeiro. No que refere as obras teatrais, o autor conta com cerca de 20 títulos. Refira-se, o Prémio Albufeira de Literatura é atribuído nos anos pares a obras de Dramaturgia e nos ímpares a Narrativa, sendo que no caso das obras de teatro o valor é de 5100 euros e no caso da Narrativa, de 10 mil euros. Conta com os patrocínios da Caixa de Crédito Agrícola – Albufeira e do Petchey Leisure Group. Receberam já este prémio os escritores Hugo Santos, Jorge Paulo, Rui Costa e, agora, Armando Nascimento Rosa. Após a entrega do Prémio Albufeira de Literatura 2008 decorreu a cerimónia de lançamento da obra vencedora da edição do ano passado, o romance “A resistência dos materiais”, de Rui Costa.

REGIÃO SUL 8.4.2008

domingo, 6 de abril de 2008

Vieira - Um grande mestre a descobrir

POR JOSÉ JORGE PERALTA*

1. Um Patriarca da Lusofonia

Vieira foi um homem admirável pelo caráter, pela coragem e pela energia, pela diversidade e profundidade de seus conhecimentos, pelo amor e dedicação à pátria, ao povo e aos bens espirituais, por sua extraordinária atuação política e diplomática e por suas estimulantes utopias.
Vieira foi um grande Patriarca da Civilização Lusófona, pelo mundo espalhada. Sua força matricial vem da tradição humanística e solidária do povo português que tem sua raiz profunda, nos diversos povos que na Lusitânia viveram e se miscigenaram (celtas, fenícios e visigodos, gregos, árabes, hebreus e romanos). O espírito do cristianismo articulou estas culturas e as temperou.

O povo lusitano foi um povo guerreiro e forte que precisou de muita sabedoria e astúcia para sobreviver e prosperar. Esta foi a força matricial que pelo mundo se espalhou e que Vieira propagou. Este é um quadro de referências necessárias para poder vivenciar toda a força e grandeza que neste homem se manifestou.

Vieira foi um dos maiores homens de toda a história do Brasil e também de Portugal de todos os tempos. Iluminou o século XVII com grande esplendor. Produziu uma obra para sempre, ultrapassando os limites do tempo e do espaço. É um clássico. É um patrimônio da humanidade.
Foi grande como orador vibrante, arrebatador e consistente; foi grande como escritor, como filósofo e como pensador; foi grande como gestor eclesiástico e político; foi grande como conselheiro, como diplomata, como articulador e como estrategista; foi grande como “historiador”, como agente e como observador da história; foi grande teólogo, exegeta e biblista; foi grande nas suas impressionantes e instigantes utopias; foi grande e implacável contra as injustiças sociais e contra toda a discriminação, por motivos étnicos ou de religião; foi um grande escritor e um grande artista; foi o homem da esperança, de pensamento e ação; foi grande humanista na sua luta pelos valores humanos e cristãos, pelos valores éticos e pelos valores espirituais; (foi um defensor dos direitos humanos, defendendo o respeito à dignidade humana dos índios, dos negros e dos brancos espoliados e dos judeus perseguidos); foi um patriota, lutando pela consolidação da independência de seu país e pela manutenção da unidade no Brasil, na guerra contra os invasores estrangeiros; foi um universalista lutando pela harmonia entre os povos e pela paz. Queria um mundo onde todos os povos se confraternizassem; queria o reino de Cristo na terra implantado.

Dizer que Vieira foi um orador monumental, um dos maiores de todos os tempos, embora seja muito, é muito pouco para sua atuação múltipla. Foi muito grande como orador e como escritor, mas foi maior ainda em sua atuação sócio - política e estratégia.

Vieira produziu uma obra múltipla, indispensável no nosso tesouro cultural. Aliou a teoria à prática. Nunca foi um homem de gabinete.

Vieira é mais conhecido por seus magistrais Sermões. Mas sua atuação político - social é ainda de maiores dimensões. Participou de alguns dos mais brilhantes momentos da história do Brasil, de Portugal e do mundo.

Além de todas as grandezas, Vieira é um mestre de nossa estirpe humana e cultural e é um homem universal. É um homem da estirpe dos gigantes. Viveu sempre com os pés firmes no chão ainda quando tratava das coisas do Alto, até mesmo quando se envolvia com suas geniais utopias.
Como Homero, Dante, Camões, Shakespeare, Goethe, Pessoa, Yung e tantos outros homens da elite moral e intelectual, Vieira pertence à humanidade que quis aperfeiçoar, livrando-a das opressões, baixezas e limitações. Todos são patrimônios e reservas morais da humanidade.
Vieira é um Atlas, erguendo o mundo em suas mãos.

Vieira é uma das glórias máximas de nossa língua, de nossa cultura e de nossa nação, no âmbito cultural, político e humanístico. Feliz do povo que tem um homem da estirpe espiritual e sócio-cultural de Vieira.

É um ser humano de extraordinário talento, com uma grande missão. Precisamos escutar suas lições.

É uma glória de seu povo e da humanidade.

2. O Preço da Grandeza

Vieira operou dentro de novos paradigmas de civilização. Atuou num cristianismo dinâmico e comprometido com o bem-comum, criativo, inovador, propositivo, afirmativo, transformador. Foi um homem do Evangelho: um autêntico, adepto do cristismo.

Vieira foi grande lutador pela paz entre os povos, pela justiça, pela liberdade e dignidade das pessoas; foi um grande patriota; foi grande pensador. Foi também um grande sofredor, porque encontrou na vida alguns mesquinhos traiçoeiros e interesseiros que colocaram espinhos no seu caminho, como aliás é de se esperar. Ele mesmo dizia que é mais honroso ter inimigos do que não os ter.

Assumiu o papel de guardião de sua pátria e de seu povo que queria ver livres e altaneiros, unidos na fé, na esperança, na liberdade e na prosperidade.

Pagou caro por suas audácias, mas seguiu até o fim com sua missão. Teve gloriosas vitórias e algumas desilusões, como é de praxe para todos os mortais que se projetam além do trivial.
Vieira foi um Mestre hábil, sagaz e sábio em tudo o que fez. Nunca teve vida fácil, mas foi um homem realizado e sempre autêntico e leal. Seus olhos brilhavam, felizes e confiantes em cada projeto que assumia. Seu sol nunca conheceu o poente.

De tudo o que fez e na vida passou, restou a glória de um imortal.

Os sofrimentos e inquietações que passou, hoje são pérolas que lhe ornam a fronte e brilham nos caminhos por onde passou.

Foi um homem incansável, com dedicação integral e irrestrita à sua missão.

Sabia que tinha uma grande missão na terra. Não fugiu nunca de suas responsabilidades. Nada o impedia. Ninguém conseguiu fazê-lo desistir. Tentaram, mas ele prosseguiu até o fim. Queria o reino de Cristo na terra consumado, onde todos se confraternizassem, com a união de todos e as diferenças de cada um, como irmãos que respeitam o mesmo Deus. Este era o tema básico do seu livro “Clavis Prophetarum”. Queria a paz, bem-estar e prosperidade solidária, para todas as pessoas de boa vontade sem distinção.

Vieira foi, talvez, o primeiro cidadão do mundo. Todos os humanos eram seus irmãos. Este era o lema da “Clavis Prophetarum”, que ficou inacabado


3. O Mestre Máximo de Nosso Idioma

Vieira ergueu um imenso, elevado e imortal monumento a Língua Portuguesa, com seus Sermões, Cartas e outras Obras.

Vieira desenvolveu, em grau sublime, as potencialidades estilísticas, semânticas e rítmicas do seu idioma materno. Explorou suas propriedades expressivas, suas delicadezas, sua força tonitruante, suas energias vitais, seu potencial de comunicação e de expressão, sua poesia. Dominou as mais profundas sutilezas de seu idioma.

A obra de Vieira é um dos mais ricos tesouros de nossa língua.

É um dos pilares centrais de nossa língua, de nossa cultura e de nossa nação, da lusofonia.


4. Monumento à Língua Portuguesa

Se quisermos erguer um monumento à Língua Portuguesa, teremos de colocar, lá no alto, Vieira com seus Sermões na mão e Camões à sua direita, com os Lusíadas, seguidos de uma plêiade de escritores de escol, de grande mérito: os Mestres e Guardiões de nossa língua portuguesa, de nosso pensamento e de nossa cultura.

Entre os escritores de escol estarão, entre muitos outros, os mestres Machado de Assis, Rui Barbosa, Fernando Pessoa, Bernardes, Eça de Queirós, Almeida Garret, Gonçalves Dias, etc, etc. Alguém precisa completar a lista, que pode conter 30 mestres geniais, ou 50, ou 100. Não será fácil fazer tal seleção pelo alto contingente dos candidatos. É possível, mas sem unanimidade, logicamente. O que é essencial é que na lista constem nomes de toda a lusofonia em todos os continentes sediados.

Não foi sem razão que Fernando Pessoa nomeou Vieira como “Imperador da Língua Portuguesa”.

Vieira, ele só é um monumento, pela grandeza de sua obra e de seu caráter, por sua dignidade humana, por sua atuação na transformação social, por seu espírito empreendedor, por sua fé, por sua arte e por suas sublimes ousadias, pela esperança e solidariedade que de sua obra irradiam.
Não queremos abordar aqui o Vieira total. Cada qual busque em Vieira o que mais lhe fala e mais lhe convém. Vieira é inesgotável, como outros luminares que a humanidade produziu, através dos séculos.


5. Gravações a Ouro em Granito

A sociedade ainda não gravou a ouro, em granito, sua gratidão para com este homem tão especial.

O Brasil ainda não lhe fez justiça, à altura de seus méritos. Portugal também não.

Fernando Pessoa procurou fazer-lhe justiça, em diversos escritos. Roma lhe fez alguma justiça pelas mãos da Rainha Cristina da Suécia, ao coroá-lo de louros dourados, após uma conferência magnífica e magistral. Também o Papa Clemente X lhe fez justiça ao libertá-lo da Inquisição. Os cardeais, os bispos, as autoridades e o povo de Roma acorriam a ouvi-lo e aplaudi-lo.
Muitos ainda nem sabem que a farsa da Inquisição foi desmascarada e que ele foi absolvido de todas as acusações... Outros até repetem tais farsas, como se fossem verdadeiras (?!). Não sabem que é falcatrua: uma armação persecutória, cheia de indignidades. Alguns fizeram tudo para fazer o linchamento moral de Vieira. Conseguiram feri-lo, moralmente, mas nada que o tempo não cure. De quem o agrediu moralmente pouco ou nada restou.

Os professores e intelectuais precisam fazer Vieira mais conhecido pelas novas gerações. Ele faz bem a todos e está fazendo muita falta.

Vieira é sempre um novo tesouro a descobrir. É uma inesgotável fonte de pesquisa.
Queremos que este texto seja um perene convite à leitura da obra deste benemérito escritor e digno homem público. Neste trabalho tentamos entreabrir as cortinas por onde poderemos ter acesso a este autor e à sua obra, naquilo que ele tem de atual, para abrir novos rumos à modernidade.

Falamos aqui de Vieira enquanto personagem presente para sempre em nossa história e na nossa cultura, ainda que muitos ainda o desconheçam. Divulgar a obra de Vieira é também um ato cívico. É divulgar a nossa cultura, é divulgar bem-querença. É aderir à eterna luta pela paz e pela fraternidade.

Vieira, em vida, exercia um grande magnetismo sobre as pessoas. Tinha um carisma extraordinário. Sua mensagem atraia multidões. Foi talvez a primeira grande estrela popular de dimensões mundiais.

Vieira sempre teve e sempre terá uma imensa rede de leitores. Se essa rede fosse mais ampla, o mundo seria melhor para todos.


6. Perseguição, Reconhecimento e Gratidão

Finalmente no séc. XXI, no seu 4° Centenário, Vieira começa a ser conhecido como é, em plenitude, com seus méritos e suas grandes realizações. Muitos pesquisadores vêm se debruçando sobre a sua obra.

Finalmente temos disponíveis os documentos básicos de sua ação, de suas agruras, das perseguições e das farsas em que o enredaram, e de suas obras e vida efetivamente monumental.

Quatrocentos (400) anos foram precisos para podermos começar a olhar o Vieira de frente, sem preconceitos. Nele descobrimos um homem moderno, ágil e versátil, de visão cósmica e holística.
Algumas autoridades da Igreja nem sempre o compreenderam. Por falta de informações, talvez. Ou por injunções adversas e persecutórias. É que sem dúvida, as audácias plenamente evangélicas de Vieira chegaram a causar constrangimento à sua Congregação. As questões “políticas” e as religiosas nem sempre estão em sintonia. A ousadia dos profetas sempre geram contradições. Isto é natural.

Vieira, um homem genial, foi sempre um homem do bem e da paz com justiça. Covardemente perseguido, enfrentando torpes conspirações e deletérias injúrias, difamações e intrigas por alguns, contrabalançadas com imensa admiração e veneração de muitos, foi sempre um homem de pensamento e de ação. Um homem de coragem e dedicação. Nada deteve sua missão.
A brutal perseguição que lhe moveu a Inquisição não o dominou. Apenas o humilhou e até o reanimou. Nunca desconhecia o risco de sua ousadia.

O homem que mais conviveu com Vieira foi seu secretário particular, que o assessorou por mais de 30 (trinta) anos, o Pe. José Soares. Não sabemos se mesmo ele compreendeu Vieira em toda a sua complexidade. O que sabemos é que foi muito dedicado e eficiente.

Esta é a hora de efetivamente resgatar o Vieira total das incompreensões e equívocos dos que ainda hoje o injuriam com as maledicências da Inquisição, e por sua posição política numa peculiar situação, no caso das invasões holandesas. Uma posição estratégica naquele momento.
Revertida à situação, ele continuou lutando com denodo pela unidade e integridade do país.
É sabido que Vieira, um homem de altos talentos, alto saber e sabedoria e um homem de ação, um grande estrategista, passou pela vida vivendo circunstâncias paradoxais: teve dias de glória e dias inglórios; viveu o sucesso e a depressão; viveu a aclamação de Domingo de Ramos, a dor e o constrangimento da Via Sacra, nas mãos da Inquisição, entre Pilatos e a cruz; e viveu a glória do Sábado da Aleluia com a publicação de seus Sermões e com a coroa de louros dourada que recebeu em Roma[i].


7. Um Herói Perseguido e Vencedor

Foi brutal e devastadora a perseguição da Inquisição sobre Vieira. Este teve pouca chance de se defender das sádicas, vazias e até ridículas e cínicas denúncias que recebeu. Teve sua liberdade tolhida. Sofreu um quase esquartejamento moral. Aliás, pouco fez para apagar as falsidades escritas a seu respeito. Tinha mais o que fazer. Defender-se? Outros que o fizessem futuramente. Contava com o bom-senso das futuras gerações que via com esperanças: Vieira foi um mártir legítimo da liberdade e do humanismo e sua fé.

Em parte, a perseguição era por motivos políticos. Os pseudo motivos religiosos eram apenas justificativas para tolher-lhe a ação. As razões ele as denunciou em Roma, onde podia falar e era ouvido e respeitado. O Papa o ouviu e o atendeu, contra as pressões terríveis que sofria para não atendê-lo.

Em outras religiões como em outras nações meritocráticas Vieira seria para todo o sempre, uma pessoa venerável, com direitos a painéis nos templos e nos espaços culturais.
Vieira é um herói do Brasil, de Portugal e da humanidade.

Que a Igreja lhe reconheça o lugar que merece, por seus méritos e por seu heroísmo, ao vencer as adversidades, pela sua dedicação à causa dos deserdados, pela herança cultural inestimável que nos legou e pela sua valentia, nas missões, na política e nas perseguições.

Por tudo o que fez, sem favor, Vieira merece nossa veneração. Vieira é um homem venerável por sua obra e por seu heroísmo. Como Joana D’Arc e como muitos outros heróis da fé e da pátria e por sua luta pela justiça social, Vieira é um mártir.

Um Mártir pelas injúrias e torturas que padeceu e pelos riscos que enfrentou de cabeça erguida; por sua audácia, coragem e dedicação.

Com sua coragem, persistência e humildade, Vieira, sozinho, abalou a toda-poderosa Inquisição. Venceu-a em Roma. Merece respeito e calorosos aplausos e não o silêncio cúmplice das pessoas que deveriam ser solidárias e responsáveis

Apesar da grande projeção da sua obra, Vieira ainda é por demais desconhecido nos tempos atuais, em muitas universidades. Só é estudado sumariamente, em aulas de literatura. Vieira é muito mais que literatura, embora na literatura seja monumental.

Vieira é um grande arsenal de cultura que não podemos desperdiçar, num mundo tão carente de exemplos fortes e convincentes.

Quem tem a oportunidade de conviver com a obra de Vieira tem a obrigação moral de o divulgar e o defender de seus algozes. É questão de justiça e cidadania. Vieira é um imenso tesouro moral que não pode continuar escondido nos escombros das maledicências de alguns.


8. Recuperando a Imagem, Abolindo Preconceitos

Vieira foi sempre um homem aberto ao mundo: Foi o homem do diálogo: diálogo entre pessoas, diálogo intercultural, diálogo inter-religioso e diálogo inter-étnico; diálogo com o passado, com o presente e diálogo com o futuro.

É preciso retomar esse “diálogo” com ele mesmo: o diálogo da vida, para além do tempo e do espaço: a diálogo da modernidade, o diálogo com o nosso tempo, o diálogo com os valores perenes de nossa civilização e diálogo com o passado, com a nossa história de que ele faz parte ativa.

Vieira, como os profetas e como os grandes clássicos, é um homem plenamente atual, por sua vida e por sua obra. É um homem perseguido, por seus atos e intenções mais nobres, mas sempre aplaudido pelo povo, sempre muito respeitado e venerado. Seus paradigmas têm plena atualidade.

De Vieira e de muitos outros profetas de todos os tempos, também falava Jesus, em Mateus 23,34 e37: “Serpentes, raça de víboras (...). Eu vos envio profetas e sábios e escribas. Vós matareis e crucificareis uns e açoitareis outros(...) e os perseguireis de cidade em cidade”. “Jerusalém, Jerusalém! Tu matas os profetas e apedrejas os que te são enviados...”.

Vieira foi um homem que lutou pelos grandes valores cristãos e humanistas: pela justiça, pela liberdade, pela dignidade, pelo amor e pela paz. Lutou pelo alegre convívio das pessoas, num espaço fraternal e descontraído, como um reino celestial instituído entre os mortais, sempre plural.

Foi um homem que teve a competência e a coragem de sonhar e soube lutar por seus sonhos para conseguir realizá-los. Os pigmeus riem com desdém das utopias de Vieira. É que nada entenderam, se julgam muito sabidos e dão vexame.

Está na hora de afastar dele os preconceitos que, desde a Inquisição, prejudicam sua imagem. Está na hora de abolir a Inquisição de nossa visão cultural. Muitos ainda nela se espelham (?!). Alguns não sabem, ou não se deram conta de que a Inquisição é irmã gêmea de todos os fascismos que vicejam em todas as sociedades.

Está na hora de recuperar a imagem de Vieira na sua pureza, nos seus méritos e no seu poder de transformação. A sociedade e a Igreja, todos têm muito a ganhar com isso. Minimamente é uma atitude cristã.

É uma questão de justiça. Justiça póstuma, mas justiça pelo qual tanto lutou.

Está na hora de a Igreja o assumir como um filho predileto que sempre foi, por sua fé, por sua dedicação, por sua lealdade e por seu heroísmo.

Está na hora de a sociedade declarar a obra de Vieira patrimônio cultural do país e da humanidade, na categoria de Patrimônio Imaterial, pelo Iphan, ou algo semelhante. A cidade de Salvador poderia estudar esta hipótese.

Vieira fez mais por sua Igreja e pela humanidade; do que muitos Papas e muitos Cardeais e muitos Bispos juntos. Fez mais por seu país e por seu povo do que muitos presidentes, muitos governadores e muitos intelectuais juntos. No Brasil é considerado um dos 13 (treze) homens que mais fizeram pelo nosso país. Não foi menor a sua ação por Portugal.

Vieira pode ter cometido erros que alguns lhe atribuem, o que colocamos em dúvida. Mas o saldo de seus acertos foi infinitamente superior. Lembremo-nos de que é melhor errar tentando acertar do que omitir-se em silenciosa cumplicidade.

Vieira precisa ser mais divulgado e mais conhecido pelas novas gerações. As pessoas responsáveis precisam assumir mais esta tarefa grande, benemérita e construtiva, para uma sociedade mais justa, mais livre e mais solidária.

Quem assumirá esta tarefa? A resposta é dada na ação. Todos são chamados. Atenda quem puder. Quem convoca é a voz da história que cultua nossas raízes. É a voz da justiça
A recuperação interessa a toda a sociedade civil, por sua arte e por seus feitos e pelos valores que defendeu. Não interessa menos à Igreja de que foi filho generoso e onde ancorou seu gênio e bebeu seu saber. Interessa ao nosso país, ao qual tanto se dedicou e interessa à humanidade da qual foi filho muito especial.



*Professor da Universidade de São Paulo (aposentado) Fundador de Instituições Universitárias Modelares e de Instituições Culturais. Doutor em Lingüística e Semiótica. Autor de Poética Multissemiótica de Fernando Pessoa e de Celebrando Vieira.


[i] Conta-se que a rainha Cristina, da Suécia, coroou Antônio Vieira, com uma coroa de louros dourada, em Roma, na ocasião em que Vieira preferiu o discurso sobre as “Lágrimas de Heráclito”

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Jornada Vieirina em Évora

Jornada Vieirina na Universidade de Évora 30 de Maio de 2008, pelas 10 horas, na sala 131 do Colégio do Espírito Santo da Universidade de Évora.

Programa

10 horas - Sessão de Abertura Intervenções:

Magnífico Reitor da Universidade de Évora, Prof. Doutor Jorge Araújo

Presidente da Comissão Organizadora de 2008 Ano Vieirino, Prof. Doutor Manuel Cândido Pimentel

Presidente da Comissão Organizadora da Jornada Vieirina, Profª. Doutora Ana Paula Banza

10h30 - Conferência de abertura

Prof. Doutor Arnaldo do Espírito Santo (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa): "A Clavis Prophetarum, outra face do pensamento do Padre António Vieira"

11h30

Prof.ª Doutora Sara Marques Pereira (Universidade de Évora): "A Universidade de Évora no tempo de Vieira".

12 horas

Prof.ª Doutora Ana Paula Banza (Universidade de Évora): "Fontes e referências eborenses na obra do Padre António Vieira".

12h30

Prof. Doutor Manuel Cândido Pimentel (Universidade Católica Portuguesa em Lisboa): "A meditação filosófica do Padre António Vieira sobre o pranto e o riso".

15 horas

Prof.ª Doutora Teresa Amado (Universidade de Évora): "Palavra e Utopia": a profecia, "O Passado e o Presente"

15h30

Prof.ª Doutora Isabel Almeida (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa): "Ver as vozes: o valor das imagens nos sermões de Vieira".

16 horas

Padre António Vaz Pinto (SJ): "Formação, Acção e Missão, na Vida e Obra do P. António Vieira."

17 horas

Prof.ª Doutora Maria Cristina Pimentel (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa): "Historiadores latinos nos Sermões do Padre António Vieira"

17h30

Prof. Doutor Francisco Ramos (Universidade de Évora): "O Alentejo e António Vieira Ravasco"

18 horas - Conferência de encerramento:

Prof. Doutor Manuel Ferreira Patrício (Universidade de Évora): "Profecia, Escatologia e Utopia na doutrina vieirina do Quinto Império".

18h45 - Encerramento dos trabalhos.

Organização: 2008 Ano Vieirino / Universidade de Évora

Informações e Contactos:Comissão Organizadora da Jornada Vieirina na Universidade de Évora

Departamento de Linguística e Literaturas da Universidade de Évora, Apartado 94, 7002-554 Évora Tel.: 266 759 350/266 759 365 Fax: 266 759 356Email: anabanza@uevora.pt (Prof.ª Ana Paula Banza)

Local: 10:00 Sala 131 do Colégio do Espírito Santo da UE

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Colóquio sobre o Padre António Vieira

O Centro de Estudos Humanísticos da Faculdade de Filosofia da Universidade Católica Portuguesa, em Braga, está a preparar a realização do Colóquio Padre António Vieira, que terá lugar a 7 de Junho.

A iniciativa desta reunião científica, que vai decorrer na Aula Magna da Faculdade de Filosofia, pertence aos docentes Cândido Oliveira Martins, Mário Garcia, S.J., João Amadeu Silva e Luís da Silva Pereira. Esta comissão organizadora afirma estar receptiva a propostas de comunicações, com a duração de 20 minutos, que lhe forem entretanto envia- das, para algumas sessões do colóquio.

No que diz respeito a prazos, o envio de propostas de comunicações deve ser feito até 27 de Abril, devendo os interessados indicar o nome e a instituição a que estão vinculados, bem como o título do trabalho a apresentar e um breve resumo.

Deste modo, os interessados podem enviar as suas propostas de comunicação através do endereço postal da Faculdade de Filosofia, das informações e contactos que constam da página web da Faculdade de Filosofia, ou ainda através do endereço electrónico cmartins@ braga.ucp.pt.
A organização recorda que desde o passado mês de Fevereiro até Fevereiro de 2009 várias universidades e academias, quer de Portugal quer de outros países, assinalam o Ano Vieirino, a pretexto da celebração do IV Centenário do Nascimento do Padre António Vieira.
São conhecidos e apreciados o perfil e a obra marcantes do Padre António Vieira, S.J., como jesuíta e missionário em terras do Brasil; como diplomata itinerante em várias cortes europeias; como pregador e mestre exímio da língua; e como fecundo pensador e profeta do Quinto Império.

A partir do séc. XVII e até à actualidade, constata-se a influência e magistério de Vieira aos mais diversos níveis, sobretudo os leitores de sucessivas gerações. Mau grado a evolução do gosto estético ao longo dos tempos, a leitura de Vieira tem atraído a admiração dos próprios criadores, como homem de acção e de pensamento, mas também como cultor modelar da língua portuguesa.

É sobre a riqueza da figura, da actuação e da obra de Vieira que variadíssimos estudiosos de diferentes países se irão encontrar em variadas reuniões académicas. Ao longo deste Ano Vieirino, terão lugar inúmeras comunicações e conferências, múltiplas publicações, diversas exposições, e outras formas de celebração de uma das figuras maiores da literatura e cultura portuguesas.

(Diário do Minho 01/04/2008)

sexta-feira, 28 de março de 2008

Por mares outrora navegados

Foram 356 dias. Durou praticamente um ano a ‘empreitada’ marítima e cultural transatlântica que Abreu Freire, investigador e professor convidado na Universidade de Aveiro (UA), e mais alguns tripulantes moveram a bordo de um veleiro para percorrer o caminho traçado pelo padre António Vieira no século XVII. No ano em que se comemoram quatro séculos do nascimento do jesuíta, Abreu Freire recorda a O AVEIRO os fundamentos e o que fica na memória de uma viagem que quase lhe ceifou a vida.

No dia 17 de Março de 2007 começou a aventura do CHIC - Cruzeiro Histórico Identidade e Cidadania. Um veleiro de 43 pés atracaria no mesmo pontão de Aveiro a 7 de Março de 2008, com cerca de mil páginas de histórias na bagagem.

Duas ordens de razões inspiraram a partida: "divulgar e entender" Vieira. A paixão pela figura brotou em Abreu Freire há mais de 30 anos, a ponto de o ter como "um dos grandes monumentos da cultura portuguesa e um dos maiores portugueses de sempre"."Pela grandeza que previu para este país, pelo seu espírito crítico e positivo, pelo empenho que teve em todas as tarefas que assumiu e pela sua visão do futuro", considera.

Ao lado do autor e comandante da expedição seguiu o alemão Dietmar Schramm, engenheiro e artista plástico e ainda o realizador Jaime Ribeiro e o cineasta Luís Costa (na viagem de ida), com o seu cão Quetzal. João Quaresma e Rafael Quaresma, marinheiros práticos do Amazonas, acompanharam-nos no regresso.

Dos assaltos a Camocim e a Belém

Na primeira paragem, em Cabo Verde, onde o Padre António Vieira passou uma semana no Natal de 1652, o grupo sofreu o primeiro "grande choque" ao ser vítima de um assalto à mão armada. Nada que desmotivasse ‘as tropas’.

Chegaram depois a Salvador da Bahia, já no Brasil, uma cidade "lindíssima, a primeira grande capital do império português, a cidade branca mais negra do mundo [risos], a cidade dos orixas, candomblés e da mistura de raças", descreve o investigador.

Depois de passarem pelo Recife, chegaram ao sítio que mais impressionou: a pequena cidade piscatória de Camocim (Ceará). "Foi quase um oásis na nossa viagem, foi a grande descoberta! É praticamente uma cidade europeia, onde tudo é português. Os nomes, as casas, o estilo... Parece uma cidadezinha do Alentejo ou das Beiras. A simpatia das pessoas foi tão grande que praticamente não nos deixaram comprar comida nenhuma. Todos os dias vinham trazer-nos peixe fresco e tomavam conta do barco".

Também São Luiz do Maranhão e Belém do Pará resgatam semelhanças "portuguesas e aveirenses", como os azulejos. A calma de Camocim contrastou com o "pandemónio" de Belém, "muito violenta, complicada e difícil" e onde foi preciso vigilância policial para proteger o barco.

Redescobrindo António Vieira

Ao longo das cidades, o grupo fez várias incursões pelo interior do Brasil, calcorreando os espaços por onde Vieira andou como educador, pregador e missionário.

"Foi em Belém do Pará e no Maranhão que ele imaginou e começou a descrever o Quinto Império e a globalização. Não foi nem em Roma, nem na Holanda, nem em Salvador da Bahia ou Lisboa, foi lá, no meio dos indígenas mais primitivos da terra onde esteve como missionário", sustenta Abreu Freire.

No Maranhão, Vieira "criou uma estratégia fantástica e fez com que hoje o Brasil fosse um só país", promovendo a ligação terrestre entre o Norte e o Sul [a navegação era impossível] através de "missões para pacificar os indígenas".

Ver a vida por um fio

O veleiro regressou à Europa fazendo escalas técnicas nas ilhas das Caraíbas, Bermudas e nos Açores e, já no continente, em Oeiras e Peniche. Porém, a volta foi melindrosa, demorando quatro penosos meses.

Atravessaram o Atlântico em pleno Inverno e enfrentaram uma tempestade tropical imprevista. Já a noite se instalara quando de repente uma "vaga imensa" fez com que o barco capotasse por completo e a tripulação temesse pela própria vida. Tiveram mais sorte que companheiros de outros barcos e não sofreram baixas.

Apesar dos muitos prejuízos a bordo e de terem de improvisar nos arranjos para "conseguirem chegar a casa", foram bem sucedidos. Percorreram quase 11 mil milhas, o equivalente a um "pouco mais de metade da volta ao mundo".

PEDRO JOSÉ BARROS, O AVEIRO, 27 de Março de 2008


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